Netflix e o consumo serializado

By Eduardo Albuquerque - 6/21/2016


 
Semana passada o Netflix divulgou informações sobre o consumo de conteúdo em sua plataforma. Se essa primeira frase te pareceu um pouco genérica e vazia, é porque ela é mesmo. A verdade é que dificilmente teremos dados mais pragmáticos vindo do Netflix. É estratégico: eles divulgam a quantidade global e local de assinantes, agora divulgaram uma média do tempo de compleição/degustação de um gênero, mas dificilmente divulgarão algum dia quantas pessoas assistiram exatamente qual série. Isso é uma pena para nós, produtores de audiovisual, não só porque nos impossibilita de fazer acordos financeiros mais justos, mas também porque nos dificulta fazer uma leitura do mercado, do que funciona ou não nessa plataforma.

Não bastasse isso, essas informações não são auditadas. Não foi divulgado um estudo e sim um press release já direcionado a imprensa para reproduzirem os gráficos disponibilizados. Dá uma olhada nesses dois veículos que divulgaram: esse e esse. Fico pensando: será que é assim mesmo a disposição dos gêneros? Tipo, não é curioso que - apesar dos supostos shows "ícones" destes gêneros serem diferentes - no Brasil segue-se a mesma exata disposição mundial no gráfico que vai do "saborear" para o "degustar"? Nenhuma mudancinha? Sério mesmo? E qual o volume dentro de cada um destes gêneros pra sabermos se é um fenômeno da série ou do gênero? Tipo, do mais visto ao segundo mais visto do gênero x, há uma diferença de quantos minutos de consumo? Ainda sobre estes gêneros... por que estes especificamente? Um "comédia familiar" não seria relevante em audiência? Não estaria nesse espectro? Por que não aparece no estudo? Como um amigo meu diz: é curioso como o algoritmo do Netflix sempre recomenda séries próprias em qualquer gênero. Das 10 séries mais vistas de cada gênero globalmente, 9 são originais Netflix. 7 no Brasil. O que pode até fazer sentido; séries originais Netflix estão em TODOS os territórios, ao passo que algumas séries estão no catálogo do serviço em país X, mas não em país Y. Todavia, com todo esse mistério/controle estratégico de "segredo industrial", só me resta mesmo fazer o conspirador de teorias.

Dados são super manipuláveis e estes me foram apenas frustrantes, pois não consegui extrair deles quase nada. Seja por serem um pouco debatíveis quanto a veracidade, seja por serem pouco eloquentes quanto à metodologia. Se formos tirar alguma coisa disso tudo é o "tempo lógico" narrativo do espectador, o quanto ele "aguenta" em média assistir um tipo de programa e o que isso representa para nós, storytellers, que temos como trabalho a possessão e manipulação desta atenção. E é sobre isso que falarei no meu próximo post.

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