O Dr. No é aquela figura na sala de roteiristas (ou num brainstorm ou qualquer atividade criativa em conjunto) que fica basicamente dizendo "não", ou "já fizeram isso em Simpsons" ou apenas procurando ângulos para contestar/maneiras de botar uma idéia proposta abaixo/pra baixo. É como se ele se visse como um jogador de batalha naval afundando idéias na água. O Dr. No é uma figura desprezível. E quer ouvir o twist? Ele pode ser você.
Sim, pois é sabido que os seres humanos consideramos a posição "crítica"(negativa) como mais inteligente Eu, por exemplo, prefiro sempre me alinhar com quem cria e não com quem destrói, mas sou humano e acabo me percebendo volta e meia criticando para que eu possa parecer e me sentir mais inteligente. E creio que é por isso que muita gente assume a personalidade do Dr. No e passa a procurar um ângulo para poder criticar, procura um jeito de desconstruir uma idéia em formação para que, assim, a presença dela seja valorizada e feita essencial. Mas a verdade é que o efeito é justamente o contrário. Um Dr. No não contribui em NADA no processo criativo. A criação tem de seguir a máxima do improviso com seu "Yes, and...", onde você dá corda para o que for, mesmo que a idéia pareça à princípio que não irá dar em nada. Numa sala de roteiristas, o bom staff writer tenta entender a lógica de quem está fazendo o pitch e tenta tabelar com ele; NUNCA tenta derrubar a lógica dele e jogar na defensiva. Não há nada mais nocivo, enervante e entendiante do que começar um "E se..." e logo já rolar um "Mas isso e aquilo...". Adversativos não tem vez nesse tipo de trabalho. O Dr. No mais do que dificulta a criação; faz ela regredir.
A parada é que existe um editor dentro de cada um de nós, que faz um trabalho ora necessário ora completamente contraproducente. Quando ele é bom, nos ajuda a não inflar o ego, a afiar uma piada, a não usar a saída mais óbvia. Quando ele atrapalha é no momento em que temos que tentar sem a presunção de acertar, quando temos que ser ridículos, sem graça, infantis, incorretos. Não há errado no processo criativo, há apenas a opção final e um bando de tentativas que te levaram até ela. Portanto, o editor dentro de cada um de nós tem de ser ligado e desligado na hora certa. A hora certa do editor é na revisão, na sintonia fina, na lapidação; nunca na criação, na materialização do bruto.
Seja sozinho ou em conjunto: não seja um Dr. No. Não se limite, não coloque balizas na sua criação; deixe isso para um segundo momento. Pule sem pára-quedas quando tiver criando e somente depois se preocupe em fazer a análise SWOT da sua criação. E em grupo, não fique na frente do outro, deixe-o finalizar o raciocínio - melhor! - ajude-o a encontrar esse raciocínio, vá até o final antes de olhar pra trás e dizer, aí sim, com propriedade: No.
1 comentários
Muito esclarecedor o texto, Eduardo!
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