Fountain e Highland

By Eduardo Albuquerque - 4/20/2015



Não bastasse ser o autor dos belos roteiros de “Big Fish” e “Go”, John August é um dos roteiristas que mais contribui para a comunidade de roteiristas. Além de ter, por anos, compartilhado sua experiência em seu blog e podcast feito junto a Craig Mazin (outro fera dos roteiros), John criou uma empresa chamada Quote-Unquote apps voltada especificamente para nosso mercado roteirístico. E dos vários projetos deles (que vão do aperfeiçoamento da fonte “oficial” dos roteiros à um aplicador de marca d’água para roteiros, passando por app pra ler roteiro no celular...) o mais grandioso e interessante, com certeza, é o Fountain. E o Highland. Ou os dois juntos. Não sei bem, acho que um não existe sem o outro – os nomes, as duas avenidas que atravessam Los Angeles e se cruzam bem no meio da cidade, já deixa sua sinergia clara - então constantemente boto-os no mesmo saco.

Lembra que falei que o Final Draft era o standard da indústria? Verdade. O que não o faz perfeito. Pelo contrário, eu diria até que o fez preguiçoso e, se antes era uma revolução, hoje em dia está muito atrasado. Desde a forma como ele é concebido - alinhado à uma inteligência/dinâmica visual pertencente a editores de texto normais (como o MacWrite ou o Microsoft Word), onde a página formata-se de acordo com a impressão e você se perde entre mil coisas que você tem que clicar/comandar para que o texto fique no lugar que ele precisa ficar, te privando de focar no mais importante: ESCREVER – até o hilário disclaimer trazido à minha atenção pelo brilhante André Pereira relativo à admitida inoperância de um feature (CollaboWrite) que eles anunciam, há várias versões, em sua propaganda!

Pois bem. Sabendo de ambas as coisas – Final Draft é muito falho, se bobear RUIM para escrever criativamente e, apesar disso, Final Draft é o standard da indústria - August criou uma denominação de arquivo chamada “Fountain”, que basicamente é capaz de pegar uma sintaxe em qualquer arquivo de texto (email, Word, Google docs...) e converter para a formatação de roteiro. Ou seja, o que importa é o “texto” e não os ícones, botões e categorizações. Amém! Que esta noção seja levada para tantas outras questões audiovisuais/criativas.

Depois, se isso já não fosse o suficiente, foi lá e criou um editor de texto chamado Highland, que tem a INCRÍVEL função de dark mode, onde o fundo fica preto e as letras brancas, o que é bom para os olhos quando escrever no escuro – só faça isso em respeito a(o) sua(seu) companheira(o) que estiver querendo dormir; se possível escreva sempre de luz acesa! – e a ESTUPENDA função de tela cheia, fazendo com que seu texto preencha gloriosamente a tela, evitando distrações de mídias sociais e o que mais for. Parece besteira, mas uma vez que comecei a usar notei claramente o quão mais produtivo me tornei. Não obstante, o Highland ainda tem outras duas coisas muito legais: ele abre e exporta .fdr/.fdx (arquivos de Final Draft) sem qualquer suor e – Glória-a-Deus-Aleluia! – transforma arquivo .pdf em texto editável!

Bom, né?

É tudo TÃO mais simples usando Fountain-Highland. Você literalmente fica focado na escrita e não em todas as outras coisas importantes, porém de zero ajuda à sua criatividade. Com o Fountain-Highland você apenas escreve. E em alto estilo, com um visual super limpo e agradável que te faz render melhor e por mais tempo. Mesmo antes de formatado, ele já parece muito mais agradável aos olhos/cabeça. Ter que se preocupar em clicar “Comand+1” porque tem que levar o cursor para o Scene Heading só te tira segundos de sinapses importantes, que poderiam ser mais bem gastos com o seu cérebro imaginando a cena e deitando-a na escrita. O processo da sintaxe vai demorar muito pouco pra entrar na sua pele; é bem simples: Scene Heading vai começar com Int. ou Ext. ou I/E. (o que você teria que escrever no Final Draft anyway, só que aqui ele já entende de cara, sem você ter que, antes, apontar no programa). Ação é qualquer texto escrito normalmente. Personagem é escrito com letra maiúscula e logo depois, embaixo, o parênteses e/ou a fala. Fim.

Claro, há algumas coisas tipo as transições, que aparecem quando o que escrevemos termina em “TO:”. A maioria é assim. CUT TO:, BACK TO: e por aí vai. Mas eu uso sempre “Fade to Black.” pra acabar meus roteiros. Sei lá, porquê. Eu gosto, então eu faço. Como eu faria isso no Highland? Ainda não sei, mas, além de ser bom ter parcimônia com transições, qualquer problema, seja este ou outro que se encontre, também pode ser consertado depois no Final Draft, certo? Afinal, o Highland exporta (e importa) os arquivos pro (e do) Final Draft e não o contrário. Então, cheque-mate, Final Draft fans.

Outro ponto positivo: é muito barato. R$ 15 dolares na app store. O único ponto negativo mesmo, para mim, é a questão de só estar disponível para Mac. O meu ponto de escrita pesada (a parte de roteiro mesmo) principal é um desktop PC por conta da minha cadeira e teclado e confortabilidade laboral. Escrever no meu Macbook por 6 horas seguidas e diariamente não me agrada, minha ergonomia fica toda zoada. Então, por isso, acabo escrevendo menos no Highland do que gostaria. Mas cada vez que sei que não vou fazer muitas páginas, ou que o foco tem que ser mais intenso ou que escrevo um documento mais livre... eu não quero nem saber de Final Draft. Corro pro cruzamento da Fountain com a Highland e dirijo(escrevo) até o pôr do sol (Sunset Blvd.), onde sonho com estrelas (da calçada da fama).

Deus, isso foi cafona...


Versão TL:DR
Final Draft ainda terá seu lugar, pois ele é mais que um programa para escrever. É um programa de produção baseado em roteiros. Reports, Revisions... roteiristas e produtores precisamos do Final Draft para isso e amém para ele! Mas do ponto de vista de “escrever” mesmo, escrita criativa, ele é bem ruim e não tem nem comparação com a praticidade e funcionalidade do combo Highland-Fountain, que tem sido para mim muito mais campeão!

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2 comentários

  1. Na real o Fountain é um formato adaptado do incrível Markdown, do John Gruber. É uma sintaxe muito simples de formatação de texto. Se você tentar abrir um word (ou FDR) em um editor de texto, o que você vai ler é um bando de códigos estranhos, isso por que são formatos fechado e codificados, apenas aquele programa consegue "ler" e formatar. Com o Markdown (e Fountain) você pode renomear o roteiro em TXT e abrir em qualquer editor de texto.

    Por que isso é importante? Por que hoje alguns arquivos do word de 95 já não abrem mais. Da mesma forma o Final Draft tem esse problema com o FDR e FDX (já reparou que quando você abre um arquivo FDR ele pede pra mudar pra FDX?). É bem provável que em 2030 o FDX já tenha sido substituido por um FDY e ai o FDR já não vai abrir mais, ai como você vai abrir um roteiro que vc escreveu durante a faculdade em 2001? Não vai. E se o Final Draft acabar? Ai que você nunca mais vai abrir um formato desses.

    Com o Fountain você vai sempre conseguir abrir o documento, já que o TXT sempre será compatível com computadores. E o Highland é apenas um dos Apps que trabalhar com o formato, você pode ver a lista aqui:
    http://fountain.io/apps

    abraço!

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    Respostas
    1. Grande Vitor!
      Quanto tempo! Legal ver você por aqui, muito honrado!

      To ligado no Markdown (quer dizer, nem manjava, mas, quando vi o Fountain e o Highland pela primeira vez, li a "origem" dele no site e eles diziam isso), só achei que não vinha ao caso no post, melhor ainda que você deu essa contribuição aqui nos comentarios! E curiosamente tava viajando nessa questão de arquivos obsoletos nesse post aqui http://www.saladosroteiristas.com.br/2015/04/scrippedcom-e-o-workflow-do-roteirista.html
      Estamos in sync! (mas eu quero ser o Justin! *fueeen*)

      Uma pergunta/curiosidade: você usa a sintaxe e esse processo todo nas suas paradas?

      Grande abraço, meu caro! Volte sempre!

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