No Q&A da semana retrasada, respondi uma pergunta do Anderson Felix, que perguntava sobre como fazer seu material ser lido, uma vez que raras foram as produtoras que responderam (positivamente ou não) à sua solicitação de envio de material (roteiro). Leiam o post pra ver a forma que julgo mais adequada para contornar este problema, mas o resumo é que esta dificuldade acontece pois, infelizmente, somos mercado e não indústria. No post de hoje, até para contrastar, vou falar de um dos mecanismos de entrada de um roteiro e/ou um roteirista na indústria americana.
Todo estúdio e production company nos Estados Unidos tem um setor/departamento de desenvolvimento, cujo braço principal é o de desenvolvimento de roteiro. Suas figuras principais são os Development Executives, ou, traduzindo grosseiramente, Executivos de Desenvolvimento.
O trabalho de um Development Exec é exatamente prospectar roteiros e roteiristas. Sabedores do posicionamento estratégico da empresa, eles trabalham em duas frentes: (i) em projetos da casa já em desenvolvimento, assegurando roteiristas para eles (através de seu contato com bons agentes) e dando notes criativos nos roteiros e (ii) prospectando roteiros e roteiristas para serem desenvolvidos pela casa. Esta segunda parte – quase 100% passiva devido ao tamanho da oferta - ele faz através de uma equipe de PA’s (Personal Assistants) e Readers (leitores), estes muitas vezes até sub-contratados. Os Readers lêem as centenas de scripts que chegam à produtora e fazem o que é chamado de “Coverage” do roteiro, uma avaliação bem simples - uma página apenas - com um resumo do básico dos dados fundamentais do roteiro (título, autor, data, gênero da história, época em que se passa a história, local onde se passa a história etc.), um logline e uma sinopse (ambas escritas pelo Reader), uma avaliação/comentário sobre o filme, uma tabelinha onde o leitor escolhe “excelente, bom, médio, ruim, péssimo” para conceituar separadamente trama, personagens, premissa, diálogo e tom, uma estimativa do tamanho do orçamento daquele roteiro e, por fim, o Reader tem de assignar, também separadamente, para o roteiro e para o roteirista, um “pass”, “consider” ou “recommend”. Desta forma, separando o joio do trigo, o Development Exec não perde o tempo dele com os roteiros muito ruins e também ajuda no momento de desespero que ele precisa de um tipo específico de roteiro/roteirista. À partir daí, o roteiro entra em negociação para ser mais desenvolvido e, quem sabe/dedos cruzados, realizado. OBS: o coverage também é utilizado em Agências e concursos de roteiro com o mesmo propósito de agilidade. Como se vê, tem muitas oportunidades por lá, muita oferta e procura.
Estes readers muitas vezes são roteiristas iniciantes, recém saídos da faculdade de cinema. O bom relacionamento e julgamento deles os fazem serem prestigiados juntos aos Development Execs, o que torna mais fácil de “pular a fila” e serem lidos diretamente pelos caras. Outros fazem a carreira por aí mesmo, sem pretensão de escrever suas próprias coisas e/ou usar o cargo como trampolim/porto seguro financeiro para o início da carreira.
Este departamento e a figura do Executive Producer, acredito que já podiam existir em larga escala aqui no Brasil. Para as produtoras o benefício é claro: consertar um problema na hora da filmagem ou na montagem é MUITO mais caro. Envolve equipamentos pesados e muitos profissionais que cobram por hora. O roteiro é apenas papel! Geralmente um broder com seu computador próprio. Essa galera do Development que é contratada da casa, então, nem entra no custo do projeto! Muito mais barato.
Fazer um trabalho forte de prospecção e desenvolvimento de roteiros e roteiristas é o caminho para que o mercado como um todo consiga ser mais lucrativo realizando produtos mais preparados/criativos/palatáveis e com orçamentos de produção mais enxutos, pensados.
O que você acha? Curtiria que houvesse esse caminho e essas figuras por aqui? Acha que funcionaria com a nossa cultura? Diz aí nos comentários!
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