Hoje é dia 1º de Abril e nós brasileiros, tiozões do pavê como somos, passaremos o dia pregando peças e/ou desviando das mentiras dos outros. Não me entenda errado; não estou criticando. Adoro o conceito da data e até tenho em minha biografia grandes momentos relativos a este dia; o mais famoso aconteceu pouco mais de 10 anos atrás e envolvia o Rodrigo Amarante e os Los Hermanos. Quem viveu/caiu, sabe.
Para nós escritores (especialmente de ficção), todo dia é dia 1º de Abril. Nosso trabalho é criar “mentiras” ou pelo menos “meias-verdades”. Então resolvi exercitar alguns pensamentos/lições sobre a arte de “mentir”. Seja você um roteirista ou apenas um zoão.
- Verossimilhança é chave.
Zoões: A surrealização como elemento de sedução caiu em desuso quando o Sensacionalista resolveu fazer disto um ganha-pão. Seja plausível. Pé no chão, procure algo próximo à você. “To grávida” é too much. Logo hoje? Não dava pra dar a notícia amanhã ou ontem? Já um “Fui demitido /Fulano disse que vai demitir o Cicrano”...
Roteiristas: Aliens no Brasil? Ok. Mas é bom que você reflita séculos de despreparo (verossimilhança) das nossas organizações políticas/sociais para/com o assunto. Uma super secreta agência high tech tupiniquim para assuntos extra-terrestres não vai colar, pois não é verossimilhante.
- A jornada é mais determinante que o destino (a mentira).
Zoões: Pense em contar sua mentira como se estivesse contando uma verdade. Parece trivial, mas não é. Coloque-se na história, questione a possibilidade quase como se igualando a quem você está tentando zoar. Ex: “Mais alguém neste trânsito caótico na Lagoa? Parece que um helicóptero se chocou ali no corte do Cantagalo”. Meu chute é que colaria e você poderia mais tarde “highten the game” e afirmar que de fato ocorreu e falar que tinha algum famoso na batida etc. e tal.
Roteiristas: Saibam mostrar suas cartas no momento certo e da forma certa. Vai prender alguma informação para torná-la game changing no meio/final? Tudo certo, mas cuidado para não ficar muito na lenga-lenga, fazendo setup exagerado. Entra na distância, golpeia e sai. Vai revelar algum fato bombástico logo de início para prender a atenção do espectador? Show! Mas é bom que o caminho até chegar naquele ponto – que veremos logo depois que surgir aquele lettering tipo “1 dia antes” - seja engajante.
- O Diabo está nos detalhes.
Zoões: é zoação,mas leve a sério. Rola uma tentação de sempre “highten the game” e à medida que o otário cai construir outra mentira em cima da mentira, mas você tem que ir humilde e consistente, se ligando para que nestes pequenos detalhes você não dê bandeira. Se você está relatando algo tenso, por exemplo, pense se sua escrita/emoção está refletindo isso ou se está escrevendo quase com um risinho de canto de boca. Essas coisas se fazem notadas, acredite!
Roteiristas: Coloque-se no lugar dos seus personagens, imaginem-se nas situações. Meditem qual a maneira mais realística de se portar/falar numa ocasião determinada. O laço de confiança entre seu storytelling e o espectador será quebrado quando um personagem mandar um sinal que não condiz com tudo que ele vinha apresentando até ali. Mesmo que seja pequeno. Um “seu bosta!” falado por um pivete pode ser o suficiente para o espectador julgar a escolha de palavras como pouca ou polida demais para o vocabulário de insultos de alguém tão acostumado com um palavreado mais solto. O mesmo se dará nas suas escolhas para a trama. Você pode até trazer uma quebra absurda que parece vir do nada, mas a superfície tem de estar calcada numa realidade constante. O velho truque do mágico de desviar a sua atenção para a mão esquerda, que fica fazendo movimentos espalhafatosos no ar, enquanto com a mão direita ele sorrateiramente enfia no seu cu.
Há!
Viu o que eu fiz ali? =P
Feliz Dia da Ficção! Que ela nunca seja mentirosa!
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