Escrever um personagem com um ator em mente é inevitável. E geralmente só te faz bem. Você começa a observar os trejeitos daquele ator em outras jornadas, pega algumas coisas dele e combina/adapta à voz do personagem que você ta criando.
Mas às vezes é uma cilada, Bino. Shit happens, lembra? Mesmo quando foi o próprio produtor que falou que “O personagem X vai ser o Fulano. Ele já fechou.”, o Fulano pode ser chamado para outro filme e preferí-lo, pode brigar com alguém da produção e abandonar o projeto, e até, dramatizando, morrer!
Já aconteceu comigo várias vezes... exceto o exemplo fatal. Ainda bem.
Meu conselho, então, é que você sempre escreva para um TIPO de ator. Por mais que cada um seja único à sua maneira, eles volta e meia se encaixam mais a um (ou mais) tipo(s) de personagem.
- Um personagem que requer um ator de comédia física. Leandro Hassum, Carioca, Katiuscia Canoro, Wagner Moura.
- Um personagem que casa bem com um galã com uma pitada de canastrão. Murilo Benício, Lázaro Ramos, Rafael Infante, Andrea Beltrão, Wagner Moura.
- Um personagem totalmente "out there", volume alto e ritmo acelerado. Tatá Werneck, Fabio Porchat, Edu Sterblitch, Ney Latorraca, Wagner Moura.
- Um personagem minimalista/neurótico, quase clown. Selton Mello, Gregório Duvivier, Luis Lobianco, Wagner Moura.
- O clueless atrapalhado. Marisa Orth, Dani Calabresa, Marco Nanini, Wagner Moura.
- The womanizer jackass/princess bobona. Rodrigo Faro, Fernanda Souza, Tatso Carvalho, Bento Ribeiro, Wagner Moura.
- O gente boa acima do bem e mal. Tony Ramos, Elias Gleizer, Hugo Carvana, Wagner Moura.
- O honrável cidadão/cidadão com cicatrizes do tempo. Milton Gonçalves, Fernanda Montenegro...e Wagner Moura.
E por aí vai.
O próprio exercício de pensar seu personagem assim, em adjetivos necessários de fora (ator/mundo real) pra dentro (personagem/mundo do seu roteiro) vai te ajudar a entendê-lo e desenvolvê-lo melhor. Hopefully, seu produtor também vai conseguir captar essa vibe (se você sentir que não, não se furte a fazer o diabinho da orelha e dar uma idéia nele) e, em caso de saída de ator previamente escolhido, vai escolher bem o seu substituto exatamente porque você escreveu para um tipo e não exclusivamente para uma pessoa. Claro; se o filme está prestes a filmar, vocês fizeram leitura de texto, a filmagem começa semana que vem... tente sim adaptar detalheszinhos de ritmo de diálogo e escolha de palavras para casar ainda mais com a pessoa em questão. Mas o nascimento do personagem não deve ser atrelado a ninguém especificamente, apenas generalizadamente.
O melhor disso é que, uma vez definido o tipo de pessoa que o personagem é, você pode botar nele a cara que quiser sem se frustrar, porque ele é um personagem que se encerra em si mesmo. A “face” dele é apenas uma face. E aí fica divertido! Já cansei de escrever personagens tendo como imagem visual o Jason Segel (love this guy), já coloquei a cara do Tony Ramos em um, do Doval, ex-jogador de futebol... uma vez, até o Mr. Pewterschmidt (o pai da Lois no desenho animado Family Guy) entrou na roda! Então nem o céu (nem a vida real ou até o fato da pessoa ser ator ou não) é o limite. Você pode “transformar” não-atores em candidatos ao Oscar e até “trabalhar” com grandes como Grande Otelo, Clint Eastwood, e, claro, Wagner Moura. É só se ater sempre ao tipo e não a pessoa especificamente. Go crazy!
2 comentários
Esse texto me lembrou o caso do Back to the Future, onde Michael J. Fox foi chamado para o filme depois de já terem gravado algumas cenas com o Eric Stoltz.
ResponderExcluirRolou isso, né? Caraca, imagina que doideira que seria... apesar da semelhança física (cabelo ruivo-ish?) eu acho eles dois tipos bem diferentes de ator. Michael J. Fox é todo hiperativo e o Stoltz mais introspectivo, sei lá...
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